EDITORIAL | Faltava o casuísmo

30 de julho de 2021 às 0h23

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Crédito: REUTERS/Paulo Whitaker

Diante das proporções dos problemas que o País enfrenta, até que demorou e, uma vez mais, as questões reais são deixadas de lado em favor do casuísmo, do jeitinho na sua pior acepção. Estamos falando da proposta e discussão da criação do semipresidencialismo, a ser inaugurado já a partir das eleições do próximo ano e entendido como fórmula capaz de remendar a estropiada política pátria. Algo como mais um passe de mágica capaz de devolver o bom convívio às mais de três dezenas de partidos políticos que, nos moldes como operam, são importantes fiadores da ingovernabilidade.

Como em outras ocasiões na vida política nacional, tem gente acreditando que é possível fazer mágica, tal como aconteceu com o parlamentarismo inventado para dar posse ao presidente João Goulart, adiando o golpe. No caso presente, apontam conhecedores dos subterrâneos de Brasília, o objetivo seria evitar o impeachment de Bolsonaro, as possibilidades de retorno de Lula e, por fim, aventuras golpistas calçadas na órbita militar. Se a ideia prosperar, hipótese que parece improvável, não seria de todo descabido qualificá-la como um até certo ponto inesperado golpe parlamentar. Nessas discussões, que ainda não ganharam intensidade, cabe ressaltar, já foi mencionada também a eventualidade de que mudanças nessa direção fiquem para 2026, o que faria mais sentido e, sobretudo, não violaria regras já estabelecidas.

Em qualquer hipótese, estamos falando de remendos e improvisações que se repetem, que muito de perto ajudam a explicar o que se passa no País, enquanto muito convenientemente para as raposas que tomam conta do galinheiro, ficam de lado as discussões sobre a reforma política, com um capítulo destacado para a reforma partidária. O gosto por este modelo, aliás, encontra elementar explicação no presente momento, quando são fixados os valores destinados à campanha eleitoral do próximo ano e sua destinação. Houvesse um pouco mais de seriedade, houvesse empenho real em buscar o caminho das soluções duradouras, e o assunto só poderia ser abordado num contexto bem mais amplo, exatamente o da reforma política, atrasada desde a redemocratização, que acabou cimentada por conta de arranjos e acertos um tanto precários, se não duvidosos.

Se os resultados são visíveis e, para a maioria, indesejados, se os sonhos e bons propósitos dos anos 70 e 80 do século passado prosseguem fora de alcance, sobram razões para concluir que chega de dar jeitinhos, fazendo da acomodação a tática de aprisionar o tempo que nos separa do futuro.

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