Credores querem família fora da livraria Saraiva

São Paulo – Um grupo que reúne alguns dos mais importantes credores da centenária livraria Saraiva está cobrando que a família fundadora se afaste da gestão do negócio.
A exigência tem sido feita em meio às discussões sobre o plano de recuperação judicial da rede varejista, que deveria ter sido votado na quarta-feira (7).
Fazem parte do grupo 21 editoras de livros, entre as quais líderes de mercado como Companhia das Letras, Melhoramentos, Nova Fronteira, Moderna, FTD e outras.
A Saraiva afirmou, por meio de assessoria de imprensa, que tem “concentrado seus esforços no diálogo com seus fornecedores para chegar a uma solução que equilibre, da melhor forma possível, o interesse de todos os envolvidos”.
Sem condições de honrar dívidas de R$ 674 milhões, a Saraiva entrou com pedido de recuperação judicial em novembro do ano passado, a fim de obter um fôlego financeiro e evitar a falência.
Com isso, obteve da Justiça a suspensão das execuções desses débitos até que seja aprovado em assembleia de credores um plano de pagamento. Até agora não houve consenso.
A Saraiva propôs pagar a boa parte de seus credores apenas 5% de sua dívida em 14 anos. O restante seria quitado somente após esse período e com o excedente de caixa a ser gerado pela empresa.
Credores trabalhistas e fornecedores que aceitem continuar dando crédito para a livraria teriam condições melhores.
As editoras não concordaram com a proposta e começaram a trabalhar em um plano alternativo. Segundo apurou a reportagem, a ideia dos credores é obter pagamento de uma parcela maior da dívida – cerca de 15% em 14 anos – e emplacar uma mudança expressiva na governança.
O grupo pleiteia que os credores tenham direito a indicar 3 dos 5 membros do conselho de administração da companhia. E caberia ao conselho indicar a nova diretoria executiva a ser contratada. Jorge Saraiva Neto, presidente-executivo da empresa, resiste à proposta.
Ele não quer abrir mão do comando da companhia fundada por seu bisavô, o imigrante português Joaquim Ignácio da Fonseca Saraiva, que começou o negócio como um sebo de livros usados no centro de São Paulo.
A relação entre as grandes editoras e a atual gestão da Saraiva é bastante complicada.
A rede varejista precisa, além de ter seu plano de recuperação aprovado, que os fornecedores voltem a vender por consignação, mecanismo pelo qual a Saraiva só paga os livros efetivamente vendidos.
As editoras passaram a vender a maioria dos produtos para a rede apenas mediante pagamento à vista, preocupadas com novos calotes.
Por outro lado, com a crise no mercado, temem abdicar de um canal de vendas tão grande quanto a Saraiva, que é a maior rede de livrarias do País.
De qualquer modo, entre os credores persiste uma grande dúvida sobre as chances de sobrevivência da Saraiva.
A despeito da moratória obtida nos últimos meses desde que a Justiça suspendeu execuções contra a empresa, a Saraiva ficou no vermelho em todos os meses deste ano.
O prejuízo acumulado chega a R$ 114,1 milhões de janeiro a junho, de acordo com os relatórios apresentados pelo Lucon Advogados, nomeado pela Justiça para administrar o processo de recuperação judicial da empresa.
O último, referente ao mês de junho, apontou perdas de R$ 22,5 milhões (os números ainda não foram auditados).
Para reduzir despesas e melhorar as margens do negócio, a Saraiva já fechou 30 das suas 104 lojas e deixou de comercializar produtos eletrônicos e de informática, que exigem mais capital de giro para financiar a operação.
Os resultados, contudo, têm sido decepcionantes. De acordo com a administradora judicial, em junho, as vendas brutas da Saraiva foram 50% menores em relação a junho de 2018 nas suas lojas físicas.
As vendas por meio da internet sofreram uma queda ainda maior, de 62%, prejudicadas por problemas tecnológicos sofridos pela empresa.
Um laudo apresentado pela livraria aos credores, feito pela Galeazzi & Associados, afirma que o plano de recuperação judicial só é viável se forem realizadas as projeções de volume de vendas, preços, margem e demais aspectos operacionais e financeiros.
Apesar das medidas tomadas pela empresa, a margem bruta da Saraiva, mês a mês, tem ficado abaixo do previsto no plano de recuperação. Em junho, por exemplo, foi de 34%, enquanto a projeção era de 37,4%.
Segundo alerta feito pela administradora judicial, o sucesso do plano “pressupõe uma melhora significativa do indicador nos próximos meses”.
A Saraiva afirmou que prevê a votação do plano de recuperação judicial em 23 de agosto.
Outro problema que agrava a situação é o fato de que o mercado editorial sofre retração pelo quinto ano seguido. Em 2018, o setor encolheu 4,5% em valores reais, descontada a inflação. (Folhapress)
Ouça a rádio de Minas