Orientação para stakeholders é um dos quatro pilares do Capitalismo Consciente, além de propósito maior, cultura consciente e liderança consciente. O termo, que se refere às partes interessadas e afetadas por um negócio ou organização, está no centro do conceito de Capitalismo de Stakeholders. Utilizado há décadas pelo fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, designa um novo papel para as empresas em relação às pessoas, à sociedade e ao planeta, no sentido de mitigar seus impactos enquanto gera riqueza e bem-estar para todos.
O Capitalismo de Stakeholders se contrapõe ao tradicional capitalismo focado somente nos acionistas (shareholders), defendido por Milton Friedman há meio século ao postular que o único objetivo de qualquer empresa era gerar lucro para os seus acionistas. Essa abordagem acabou provocando um desequilíbrio, pois é preciso considerar os demais stakeholders na geração de resultados sustentáveis.
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As organizações precisam reconhecer a interdependência do sistema, pois, sem clientes, fornecedores, funcionários, comunidades, meio ambiente, acionistas e outros, nenhuma empresa existiria. O fato de reconhecermos essa interdependência e criarmos canais de comunicação entre os diversos stakeholders nos permite inovar de maneira mais eficiente, crescer de forma mais estruturada e criar valor em múltiplas dimensões e conexões, gerando relações ganha-ganha-ganha.
Na introdução do seu célebre livro “Capitalismo Consciente: Como Libertar o Espírito Heroico dos Negócios”, em co-autoria com Raj Sisodia, John Mackey, fundador do Whole Foods, conta como os stakeholders se manifestaram após a tragédia do Memorial Day de 1981, quando uma enchente em Austin (Texas) quase levou a então jovem empresa de uma só loja à falência. Segundo seu relato, dezenas de clientes e vizinhos compareceram à loja no dia seguinte à inundação para limpá-la e ajudar a salvar o que fosse possível; colaboradores trabalharam sem receber remuneração; dezenas de fornecedores se prontificaram a reabastecer a loja com base no crédito; o banco concedeu empréstimo para a reconstrução; investidores fizeram novos aportes de capital. Tudo isso porque a marca, desde o início, estabeleceu uma estreita relação com todos os seus stakeholders, envolvendo cuidado e compromisso. Como resultado, o Whole Foods não só se recuperou, como floresceu a ponto de, em 2017, ser vendido à Amazon por 13,7 bilhões de dólares.
Outro exemplo: no dia 19 de agosto de 2019, a Business Roundtable – associação que reúne as maiores corporações dos Estados Unidos – lançou um manifesto assinado por 181 CEOs de grandes empresas americanas reafirmando o compromisso dessas companhias com todos os seus stakeholders e com o bem-estar social. Esse propósito de responsabilidade corporativa, segundo o documento, deve ser mais importante que o próprio lucro. O documento assinado é denominado Declaração sobre o Propósito de uma Corporação e substitui todas as declarações anteriores da associação, descrevendo um novo padrão moderno de responsabilidade corporativa. Entre as 181 empresas que assinaram o manifesto, estão Amazon, Apple, Bayer, Coca-Cola, Dell, IBM e Microsoft.
Por outro lado, a multiplicidade de relações que as organizações estabelecem com seus diversos públicos aumenta os riscos e a responsabilidade da liderança. O poder para transformar as empresas e os modelos de negócios está, de fato, com os líderes, sejam eles empresários, acionistas controladores, conselheiros, investidores ou administradores. O tom vem da liderança e praticar o que se fala (walk the talk) é crucial.
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Nesse contexto, conselheiros e demais agentes de governança devem se empenhar em consolidar uma nova abordagem de tomada de decisão, considerando os impactos e expectativas de um conjunto cada vez mais diversificado e complexo de stakeholders. Colocar em prática e fortalecer as estruturas ESG são apenas os primeiros passos. O estágio mais avançado é o desenvolvimento de uma cultura ética, baseada em princípios e valores efetivamente observados no dia a dia.