EDITORIAL | A conta é tudo que nos sobra

3 de agosto de 2019 às 0h02

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Crédito: REUTERS/Ricardo Moraes

Para os gregos, que moldaram a civilização ocidental contemporânea, a política deveria ser entendida como a principal e mais nobre das atividades humanas. Um ensinamento sábio, precioso, que se perdeu no tempo, bem distante de suas referências iniciais. Que o digam os brasileiros, e por razões que, bem atuais, não precisam ser lembradas. Política, hoje, e não estamos sós, é um jogo de poder e de ambição, à margem dos valores que os gregos souberam cultivar tão bem, distante do interesse comum, dos valores coletivos.

No Brasil, partidos políticos, que são mais de trinta e podem dobrar, caso todos os pedidos em apreciação sejam aprovados, não têm ideologia, não têm projetos, nem mesmo programas que mereçam ser levados a sério. Absolutamente alheios ao interesse público e a seus mais elementares deveres, as ditas agremiações sem dúvida alguma ajudaram a cavar mais fundo o buraco em que o País se encontra, roubando o presente, o futuro, e as esperanças dos brasileiros. Roubaram, não raro e tampouco por acaso, literalmente.

E nada parece ter mudado além das aparências. É o que nos dá conta a notícia de que os partidos políticos poderão receber R$ 4,6 bilhões em recursos do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário, conforme recentemente estabelecido pelos próprios políticos, no Congresso Nacional. Esse valor é 22 vezes maior que os R$ 196 milhões gastos nas eleições de 2010. Desnecessário dizer que a inflação no período foi muito menos, tampouco lembrar que o País atravessa uma crise econômica sem precedentes e vem contingenciando recursos para áreas tão sensíveis quanto a educação, saúde e segurança pública. Também não nos parece necessário lembrar que o uso desses fundos, o financiamento público de campanhas, criados sob a inocente ideia de que evitariam a corrupção, já alimenta desvios, atualmente objeto de inquéritos policiais.

Vergonha, absoluta vergonha, e ficamos nisso para poupar os mais sensíveis. O previsto aconteceu, dinheiro continua sendo distribuído à farta para alimentar um sistema disfuncional, em que corrupção continua sendo regra e o distanciamento do interesse público algo que não se leva em conta, que não é levado em conta por aqueles que sequestraram o Estado brasileiro, que fingem mudar exatamente para deixar tudo como está, se não ainda pior. Mérito e compromisso são atributos que não vêm ao caso, exceto para uma minoria que, nas circunstâncias, acaba neutralizada, à margem, quanto não se afasta de uma atividade que em nada mais lembra o que dela pensavam os gregos.

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