Há machismo nas instituições?

20 de julho de 2019 às 0h01

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Cláudia Al- Alam Elias Fernandes*

Nós, as mulheres nascidas nas décadas de 1970 e 1980, conhecemos a vida adulta quando a Constituição já havia dito que homens e mulheres eram iguais perante a lei, quando o conceito da mulher honesta já não era mais usado em nosso ordenamento jurídico, quando já havia mulheres importantes em cargos de primeiro escalão no poder público. Entretanto, quando a minha geração chegou ao mercado de trabalho, nós lutávamos para ter o direito de entrar no Tribunal de Justiça de calças compridas e de escolher profissões que ainda eram masculinas. Que atire a primeira pedra a profissional da minha geração que nunca se sentiu lisonjeada ao receber um elogio do tipo: “Nossa, você é um homem trabalhando ou gosto de trabalhar com você porque você parece homem, não é do tipo mulherzinha.

Chamo a isso de misoginia estrutural, um pensamento que cria um fenômeno não explícito e difícil de provar de falta de oportunidade de promoção e de contratação para trabalhadoras, especialmente as que são mães ou que são consideradas em idade de ser mãe. O conceito e a prática estão tão arraigados que parecem natural a todos os envolvidos. Mais do que isso, muitas mulheres acabam aceitando um salário menor, por acreditarem que não merecem mesmo ganhar o que os homens ganham, uma vez que ao contrário delas – estes homens estão livres para direcionar 100% de sua energia para o trabalho. Neste cenário de maternidade, além da preterição em promoções, é onde normalmente nasce a disparidade de salário, apenas a ponta visível do iceberg.

E o Direito do Trabalho socorre essas mulheres? Como fica a questão da igualdade de gênero no ambiente do trabalho? Infelizmente, na prática, o Direito do Trabalho nem sempre consegue socorrer as vítimas deste sistema. Primeiro, porque a própria mulher não consegue enxergar sua condição de vítima do machismo estrutural, exatamente porque ele é estrutural. Depois, porque as reivindicações de igualdade de gênero são facilmente atribuídas à fraqueza e chamadas de mimimi. Reduzidas à condição de menor importância, as mulheres se calam.

Vislumbro, entre tantas medidas para redução desta misoginia estrutural, que as muitas mulheres presidentes de empresas, controllers ou empreendedoras, apareçam para o mundo para que outras acreditem que também podem chegar. Outra medida importante seria treinar gestores e gestoras reiteradamente para olhar para a carreira das mulheres da sua equipe a fim de garantir que não fiquem à margem das promoções e qualificações.

E, lembremo-nos: negar a existência de um comportamento misógino estrutural nas corporações ou silenciar sobre ele, é ser cúmplice. Não nos calemos.

*Advogada trabalhista, mestre e doutoranda em Direito do Trabalho (USP), sócia-fundadora do escritório Elias Fernandes Advogados

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