Viver em Voz Alta
Ainda sobre os poetas da família Guimaraens
17 de novembro de 2023
Organizado por Afonso Henriques Neto, “Correntezas em tinta e versos – quatro séculos de poesia na família Guimaraens” (Editora Ibis Libris, 310 páginas), será lançado, como já adiantei na coluna da semana passada, em 30 de novembro, às sete e meia da noite, na sede da Academia Mineira de Letras, em sessão aberta ao público. A antologia apresenta rigorosa seleção do trabalho de onze membros da família de Afonso, que participa do volume com vinte e dois poemas, entre os quais o belíssimo “Soneto para o avô Alphonsus”, que reproduzo a seguir: “Linguagem densa, plástica de abismo,/canto em ritmo púrpuro e nevoento,/nas taças vertes o sumo em que cismo/sangue feito palavra, mais o lento/escorrer de um amor estrangulado/na nudez de um álgido cemitério,/grito escuro da pedra, do quebrado/e roxo espasmo do topázio em aéreo/exaurir-se de templos vagos, curvos,/poentos, e esse batalhão de espectros/lazarentos a fluir de um céu de turvos/emblemas da morte com que me crismo,/ó poema dos delírios circunspectos,/linguagem densa, plástica de abismo.”
Tradutor, contista, romancista, Afonso Henriques escreveu mais de uma dezena de livros de poesia. Sobre ele, escreveu Carlos Drummond de Andrade: “Sua personalidade poética é indiscutível – tanto mais quanto, chegando após duas gerações de poetas de alta qualidade, ela se afirma independente da influência dos grandes próximos que o rodeiam. E é tanto mais curiosa essa personalidade quanto ela se permite ondular entre formas simplesmente modernas de poesia e formas de nítida vanguarda, como a experimentar a força nos dois setores.”
Para Cacaso, “a alegoria de Afonso Henriques é fortemente evocativa, uma espécie de inventário de ruínas – familiares, ideológicas, pessoais. (…) O mundo está degradado, mas ainda vale a pena: o poeta retira da visão desencantada o móvel para repropor o sonho.”
Da mais nova geração, Lucas Guimaraens estreou com “Onde (poeira, pixel, poesia)” (2011), a que se seguiram “33,333 – conexões bilaterais” (2015), “Exílio – o lago das incertezas” (2018) e o recém editado “Amarrar o corpo na lua” (2022). Domingos Guimaraens publicou “A gema do sol” (2006), “Amoramérica” (2008)”, em coautoria com Augusto de Guimaraens e Mariano Marovatto, e “Agora também antes” (2017). Augusto de Guimaraens escreveu “Os tigres cravaram as garras no horizonte” (2010), “Fui à Bulgária procurar por Campos de Carvalho” (2012) e “Máquina de fazer mar” (2016).
É de Lucas o belo “Palavras”: “Suas pernas/fechadas/um fogo/ de imaginário./Palavras eróticas./Não busque/ aqui/o rabisco/da verdade./Palavras/não trepam/não rangem/não mordem/não suam/não visitam/a avó morrendo/a mãe de leite/que foi relegada/na primeira tragada/de movimentos de partidas/da casa da infância./Palavras não são mágicas/como quiseram filósofos/e poetas craquelados./Palavras não molham/não temem/não estendem/as mãos/ou chutam/velhas tábuas/& suas fés./ Palavras sonham/que palavras/são vivas/minhas mãos/podem ser pássaros/como posso ter/em você/ a fantasia/ que só os melhores deuses/conhecem./Palavras sonham/que podemos sonhar/e aquela morte não veio/ou não virá/que a dança/será transa/quando a lua/ pousa/seus/pés/na beira/da Serra/do Curral.”
* Jornalista. Doutor em literatura. Presidente emérito da Academia Mineira de Letras.
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