TILDEN SANTIAGO*
Quando faz escuro os poetas cantam, como aconteceu com Tiago de Mello em 1965, após o golpe. Uns poetas nos incitam a buscar luz, a resistir em meio às trevas. Felizmente! Mas outros se acovardam sucumbindo à escuridão, alguns até mesmo abraçando a submissão e semeando versos alienados, que incitam os coletivos humanos à inércia, ao desânimo, ou a uma esperança que não passa de ilusão, ou até mesmo à fruição egoísta do atual modo de produção.
PUBLICIDADE
Num tempo sem sol, é melhor, a meu ver, escutar humoristas e chargistas (do que poetas!), muitos empenhados em verdadeira verve profética, capaz de nos fazer discernir e denunciar o mal-estar presente e nos projetar na verdadeira esperança do nascimento de um novo tempo futuro. São mestres em ridicularizar os poderosos e os mais abastados e em suscitar compaixão e solidariedade para com os pobres, oprimidos e excluídos de toda sorte – a grande massa humana que vive na terra “uma grande tribulação”, como nos revela o apocalipse.
Nas gerações dos anos 50 e 60, quando queríamos dedicar nossa vida ao povo e à Nação, éramos obrigados a escolher entre a “política” e a “revolução brasileira”. Embora não exista revolução sem partido e nos tempos sombrios, sem sol, política e (R)evolução acabam por se confundir para aqueles que ousam cantar, mesmo quando faz escuro.
Os tempos são outros: o fim da Guerra Fria, a alta acumulação de capital especulativo nas mãos de poucos e a concentração do arsenal bélico em poucas nações dominadoras tentaram tirar o termo “revolução” do dicionário dos povos da periferia do mundo. Nem por isso, conseguiram anular a consciência e o sonho de muitos que ligam a política à necessidade de mudança, de uma transformação radical da sociedade em suas próprias estruturas de produção, acumulação e má distribuição.
Quem melhor explicitou atualmente uma nova visão foi o sociólogo, professor, filósofo e escritor Edgar Morin. O qual, na teoria e na prática, proclamou a necessidade de abolir o conceito de “revolução” em troca do conceito de “transformação”. Ele tem moral como pensador e como ativista, como Indignado em seus 94 anos de idade, de propor e vivenciar essa nova perspectiva.
PUBLICIDADE
Judeu, nascido numa ilha do Mediterrâneo próxima à Turquia, aos 17 anos foi morar em Paris com a família, subindo com o fuzil a tiracolo, imediatamente, para as montanhas da Resistência ao Nazismo, junto a seus coirmãos hebreus e a numerosos democratas e comunistas. Terminada a guerra, Edgar envolve-se na redemocratização da França e da Europa, através do Partido Comunista Francês (PCF) e da atividade intelectual.
Ele nos convida a focar a “transformação”, como uma verdadeira (R)evolução. Uma mudança da sociedade, não por saltos históricos periódicos, mas diariamente, no cotidiano dos cidadãos, na educação, na psicanálise, na política, no trabalho e na família.
O problema é que o jovem brasileiro não vê hoje um partido político que opere na direção da mudança social. Somos hoje, novos Diógenes, com lanterna na mão, procurando um partido decente que faça caminhar o Brasil e seu povo. Com esse artigo, minha saudação de boas festas aos nossos leitores.
*Jornalista, embaixador e sacerdote anglicano