Diplomacia é mais do que política

3 de abril de 2019 às 0h01

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Créditos: Menahem Kahana/Reuters

TILDEN SANTIAGO*

Muita gente acha que “política” e diplomacia são a mesma coisa. Ledo engano! A política divide sempre. Divide para dominar, para manter o poder. É de sua essência provocar divisões para ter o controle. É a prática tanto da direita, do centro e da esquerda. Nesta, que conheci gente que não sabia fazer política sem um “inimigo”. E na falta dele criavam um! Puro fanatismo inútil!

A diplomacia, ao contrário, busca a convivência pacífica entre indivíduos e Nações. Na história universal, sempre houve “embaixadores” que foram fiéis à palavra do profeta – itinerantes que percorreram vales e montanhas semeando a Paz fundamentada na Justiça.

Quando embaixador em Cuba, comentei essa passagem diante do Comandante Fidel Castro, ao recepcionar o presidente Lula no Aeroporto José Martí, em Havana. Imediatamente o Celso Amorim, então chanceler brasileiro, me pediu a citação bíblica, mesmo sendo um intelectual agnóstico. Política e diplomacia são missões, artes diferentes.

Sempre houve, na história, políticos que souberam conciliar as duas dimensões, embora distintas. E sua sensibilidade civilizatória, contra a barbárie, sonhando com a unidade dos povos, que não se constrói com as armas e a guerra, no mínimo souberam nomear chanceleres inteligentes e competentes.

Foi o que sucedeu com Getúlio, JK, Jango, Jânio Quadros, Sarney, Itamar Franco, FHC, Lula e Dilma. FHC e Itamar chegaram inclusive a chanceler e embaixador.

Nos poucos meses do governo atual, o ponto mais frágil, junto com a Educação, são as Relações Internacionais. Foram ridículas as três viagens promovidas por Bolsonaro.

É importante essa análise crítica, mesmo torcendo para que seu governo dê certo, em função de um real benefício para a população brasileira: fim do desemprego, crescimento da renda, fim da violência, da miséria e da pobreza, (uma diminuição pelo menos), melhoria da saúde, da educação e segurança, erradicação da corrupção sistêmica e do crime organizado, uma economia que provoque a sensibilidade de empresários e investidores, emprego pleno, políticas públicas em benefício da população.

O desenvolvimento deveria ser o foco principal deste governo como prioridade, e não uma Reforma da Previdência no mínimo polêmica. Maior atenção com os direitos humanos das minorias (?) excluídas e vitimas de preconceito.

A primeira viagem foi ao Fórum dos Empresários em Davos. Triste coincidência! Lá o presidente mostrou o Brasil como um paraíso para se investir. E destacou nosso país como um modelo de proteção ambiental no mundo de hoje.

Simultaneamente uma tragédia criminosa inundou de lama o Vale do Paraopeba, com risco inclusive para o Velho Chico, ceifando muitas vidas, invadindo campos plantados e moradias. Mariana com a Samarco antecedeu o vazamento de rejeitos da Vale em Brumadinho e agora um bom número de mineiros vivem na agonia de novas invasões de lama.

A comédia de Davos termina com o tradicional sobrevôo de helicóptero, levando presidente e outros políticos para “contemplar” o inferno de Brumadinho.

A segunda viagem foi aos EUA. Outro vexame! Eles levaram mais benefícios com essa visita. Mais grave foi a submissão de nossa soberania nacional ao líder mundial do conservadorismo. A segunda comédia demonstra subserviência que só existia durante a guerra fria pelas pressões das duas potências. A viagem a Israel, uma verdadeira tragédia diplomática.

O presidente volta atrás no que disse sobre transferência da embaixada para Jerusalém. Limitou-se a anunciar a instalação do escritório de negócios. Frustrou israelenses e irritou palestinos e árabes!

Oriente Médio é briga de cachorro grande! Presidente inexperiente, sem chanceler arguto, mostrou que não tem política externa para o Brasil e deixou clara sua incapacidade de governar um país em desenvolvimento, mas sempre vítima das crises cíclicas do crescimento capitalista.
Rodrigo Maia tem razão: “Bolsonaro precisa parar de brincar, sentar na cadeira e governar o país”.

Não dá para brincar de fazer teatro no muro das lamentações, kipá na cabeça numa falsa aparência de espiritualidade judaica. Nem brincar com um fuzil israelense. Se um dia visitar Ramalla (capital do Estado Palestino) espera-se que ele não repita o teatro de atirar com uma kalashnikov ou com uma seminov.

Certamente o presidente percebeu sua ignorância sobre o conflito no Oriente Médio, onde está em jogo a paz mundial. Israel com seu potencial bélico, cultural e histórico é o braço político e armado dos EUA e palestinos, uma das vanguardas do Movimento Revolucionário no mundo. Palestina tem muito do significado histórico do Vietnam e da África do Sul.

Complexa relação entre esses primos semitas. Esse escriba viveu três anos no Oriente Médio convivendo com palestinos, israelenses e jordanianos. E foi pouco para me aprofundar. Não é por ser batizado nas águas do Jordão que o mistério dessa região entra por nossos poros.

A lição está dada: Davos e Brumadinho, uma comédia trágica. EUA, uma comédia que nos humilha como soberania. Israel, uma tragédia diplomática! Diplomacia é muito mais do que política.

*Jornalista, embaixador e militante

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