Ecumenismo rima com humanismo

8 de dezembro de 2020 às 0h06

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Crédito: Pixabay

Cesar Vanucci*

“A fé é um pássaro que pousa no alto da folhagem e canta nas horas em que Deus escuta”. (Joaquim Nabuco)

Insistimos na temática ecumênica. Faz todo sentido. Vivemos instante humano perturbador. Sedento de amor, de compreensão, de tolerância. Em momento assim, posturas ecumênicas ganham especial significado por remeterem a questões essenciais, a nobres aspirações humanas.

O ecumenismo tem tudo a ver com humanismo, que é a nossa própria razão de viver. Responde com vigor escorraçante às propostas radicais dos fundamentalismos de todos os matizes. Setores que se prevalecem de rançosos (pré) conceitos, com conotações invariavelmente racistas, para baixar regras de comportamento em estridente dissonância com a dignidade humana. O espírito ecumênico torna explícito que religião não pode significar obstáculo à liberdade. A fé há que ser encarada, dentro de perspectiva religiosa autêntica, como “um pássaro que pousa no alto da folhagem e canta nas horas em que Deus escuta”, conforme lírica observação de Joaquim Nabuco.

Do ponto de vista ecumênico, as religiões mostram pontos consideravelmente mais numerosos de convergência do que de divergências. Equivalem-se em mérito na busca do diálogo sincero com Deus. Com doses mais maciças de boa vontade, desarmamento de ânimos, respeito, zelo pela primazia dos valores fundamentais das diferentes crenças, reconhecendo que no fundo todos são valores extremamente parecidos, as religiões estarão capacitadas a oferecer valiosíssima contribuição na construção de um mundo melhor. Na retomada, digamos assim, do mundo pela humanidade.

Empolga-nos a fala ecumênica. Todas as vezes em que a percebemos, enunciada nalgum ambiente cercado ou não por ritualística religiosa, imaginamos a presença ali de criaturas inspiradas, propensas a deixarem de lado as diferenças na forma, para se fixarem, em junção fraternal, no conteúdo do culto aos valores transcendentes da vida.

Nos pronunciamentos do admirável Papa Chico, o ecumenismo vem ganhando, pelo lado cristão, sonoridade e intensidade com certeza nunca dantes registradas. João XXIII e João Paulo II estimularam também ações positivas no tocante à aproximação das religiões. Das outras grandes correntes religiosas, pouco se sabe quanto à real disposição de suas lideranças qualificadas em se associarem às práticas ecumênicas. O Dalai Lama, dignitário de facção budista de forte expressão, parece ser, delas todas, a liderança que melhor assume publicamente atitude propositiva com relação ao tema.

Entendemos que os meios de comunicação social estão capacitados a contribuir de maneira efetiva para a propagação do ideal ecumênico, amortecendo tensões resultantes das dificuldades que se antepõem, em tantas partes, ao exercício da liberdade de expressão religiosa. É certo que a tevê e o rádio reservam espaço considerável para divulgação religiosa. Nos casos específicos das emissoras vinculadas a correntes ideológicas bem configuradas, os temas focalizados atendem naturalmente às conveniências do proselitismo.

Mas, de qualquer modo, as mensagens são irradiadas para plateias imensas. Pena que uma tribuna de tamanha magnitude não dedique também boa fatia de tempo para a fala ecumênica. Temos para conosco, com razoável conhecimento de causa, que poderão se revelar altamente compensadores os índices de audiências para programas produzidos com talento, abarcando estudos e debates de questões momentosas que coloquem lado a lado especialistas do pensamento cristão, budista, maometano, judaico, assim por diante.

Participando, vários anos atrás, de uma missa dominical natalina na Igreja do Carmo, Belo Horizonte, sentimo-nos tomados pelo fascínio de uma celebração de ponta a ponta impregnada de genuíno ecumenismo. Toda a composição litúrgica denotava isso, a começar pelo presépio, de singelo simbolismo, que ornamentava a nave principal do templo, confeccionado por meninos assistidos socialmente pela paróquia. E a mensagem, então, do celebrante Frei Cláudio van Balen!

Um senhor cântico de louvor à divindade e à humanidade. Sem chavões piegas, sem fórmulas estereotipadas que pudessem desfigurar o sentido da sabedoria evangélica. Fala harmonizada com os clamores sociais da hora. Com os anseios de paz que habitam a alma das ruas. Anseios esses que se contrapõem à belicosidade fundamentalista que tanta angústia traz aos corações e mentes dos homens e mulheres de boa vontade em todas as latitudes deste nosso mundo velho (e cansado) de guerra.

*Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

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