EDITORIAL | O que falta é vontade

22 de setembro de 2020 às 0h15

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Crédito: Marcus Santos/Usp Imagens / USP Imagens

Depois de anunciar sua decisão de abandonar a ideia de criação de um novo programa de renda básica, o presidente Jair Bolsonaro transferiu ao Congresso Nacional a tarefa de decidir a respeito. Uma empreitada nada fácil, considerando os valores discutidos e, para quem conhece as contas públicas, na realidade impossível.

Como foi dito aqui mesmo, o que se cogitava faz absoluto sentido, desde que se pretenda, a sério, garantir aos brasileiros mais necessitados condições mínimas de subsistência, e com a dupla vantagem de ao mesmo tempo irrigar a economia, alavancando o consumo. Nada, entretanto, que se possa fazer, e sustentar, por mero voluntarismo.

Como já foi varrida a ideia estapafúrdia de congelar aposentadorias e salário mínimo para assim levantar os recursos necessários, é de bom alvitre lembrar que existem sim caminhos possíveis, desde que mudem as prioridades. E começando pelos gastos com o funcionalismo, que, somados ativos e inativos, só não representam mais que os gastos com a rolagem da dívida pública, num processo de adequação que, para ser sério, teria que passar pelos três poderes.

Todos sabem que existe espaço para isso e aos que não sabem oferecemos alguns exemplos: um auditor fiscal ganha R$ 355 mil por ano, enquanto um colega seu nos Estados Unidos recebe R$ 245 mil; um deputado federal recebe, e sem contar os “penduricalhos”, R$ 439 mil em doze meses, contra menos da metade de um colega seu na Suécia; a um ministro do Supremo são reservados R$ 510 mil por ano, enquanto um colega seu francês tem que se contentar com R$ 338 mil. Numa última comparação, a um procurador federal paga-se R$ 510 mil por ano, valor que na rica Alemanha equivale a menos da metade, R$ 253 mil.

Estamos mirando só o topo e, evidentemente, não contamos tudo para demonstrar que, sim, é perfeitamente possível cortar sem que seja preciso, como disse o presidente da República, “tirar do pobre para dar ao miserável”. Melhor ainda será mencionar estudos do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, o respeitado Ipea, apontando que reformas adequadas poderiam representar, para a União, estados e municípios, economia entre R$ 1,3 trilhão e R$ 1,7 trilhão em 20 anos e isto considerando regras aplicáveis apenas a novos servidores, além das aposentadorias que necessariamente acontecerão no período.

Enxergar a realidade tal como ela se apresenta pode assombrar diante dos despropósitos que serão vistos, mas, e na mesma medida, basta para animar aqueles que pensam que não existem saídas. O que falta é vontade de mudar.

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