É certo, certíssimo, que a vacinação em massa teve papel fundamental, incontestável, na contenção da pandemia e de sua letalidade. Também é certo que no espaço científico acreditado persistem dúvidas sobre a matéria e, inclusive, seus riscos, mas prevalecendo felizmente que entre as duas possibilidades, vacinar ou não vacinar, a primeira é a que prevalece porque representa o menor dos riscos. Nos países em que o assunto foi abordado da melhor maneira, as mortes por milhão foram menores e até certo ponto garantida a segurança coletiva. São fatos, mas nem todos assim entendem, lembrando que são relativamente fortes, dos Estados Unidos a alguns países da Europa Oriental, principalmente, reações contrárias, que têm origens bem antigas, inclusive religiosas, dando espaço para uso político da situação, mesmo com as evidências que pululam.
No Brasil as coisas foram e ainda são bem mais complicadas. A compra de vacinas e a posterior vacinação foram incompreensivelmente retardadas, o que pode explicar muitas das perdas contabilizadas. Tanto pior, o próprio governo federal, apesar de tudo que aconteceu nestes dois anos e pouco, não perde chance de condenar e atacar a vacinação, numa atitude política, provocativa, que dificilmente renderá bons dividendos. O caso mais recente foi do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que, sem maiores explicações, disse que quatro mil mortes teriam sido provocadas pela vacina. Primeiro a informação, e em seguida a correção: na realidade ele se referia a estudos sobre o assunto, enquanto registros idôneos apontam 11 mortes. No mesmo dia, crianças foram vacinadas, no Nordeste, com medicamentos vencidos e de uso adulto, fechando o circo de horrores que começou com um suposto ataque aos sistemas de informática do Ministério, que continua funcionando com limitações graves sem que se tenha qualquer notícia das investigações.
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Do mundo oficial, dos ditos altos escalões, nenhuma palavra a respeito. Nem de esclarecimentos, menos ainda o devido pedido de desculpas ou o anúncio das punições reservadas aos culpados. Afinal, não se pode esperar mais que isso, lembrando as próprias atitudes do presidente da República, de quem se anuncia que estaria empenhado num trabalho de recuperação de sua imagem, que chegou ao ápice do desatino quando usou as redes sociais para anunciar, compenetrado, a existência de estudos comprovando a associação da vacinação a novos casos de Aids. Prontamente desmentido, evidentemente, o presidente da República, primeiro responsável pela gestão pública, mais uma vez não se deu ao trabalho de desmentir ou, pelo menos, tentar esclarecer sua fala. Nesse ambiente, não há mesmo como esperar coisa diferente, por mais grave que seja o assunto.