EDITORIAL | Uma bomba a desarmar

7 de agosto de 2020 às 0h15

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A população carcerária brasileira gira em torno de 770 mil indivíduos, número que triplicou em vinte anos e corresponde aproximadamente à metade da capacidade de vagas no sistema prisional. A realidade neste caso parece ser ainda pior que os números e não quer dizer, necessariamente, que existam no País dois presos para cada vaga disponível, existindo casos de prisões superlotadas, abrigando até três vezes a sua capacidade, assim transformadas em sórdidos depósitos de presos, em precárias condições de sobrevivência e sem qualquer chance de recuperação.

Triste destino, especialmente para os 253 mil encarcerados sem qualquer condenação e terreno fértil para o dito crime organizado, cujas diversas facções representam o poder real no sistema.

Totalmente distanciadas dos conceitos de ressocialização e reeducação, as prisões brasileiras nem mesmo conseguem, de fato, apartar os indivíduos mais perigosos, sendo notório o fato de que mesmo atrás das grades são eles que controlam o crime no mundo exterior, especialmente no que toca ao tráfico de drogas. São constatações que nos ocorrem a propósito da morte, em Manhumirim, vítima do Covid-19, de um preso de 28 anos, pai de dois filhos, condenado a 5 anos de prisão por ter sido encontrado com 10 gramas de maconha durante uma batida policial. Seu advogado pediu que ele aguardasse em liberdade o resultado de recurso contra a sentença e mais três pedidos de habeas corpus, dois deles negados e o terceiro caducado pelo falecimento do condenado, vítima da doença que vai se alastrando pelos presídios brasileiros.

É elementar que nada disso faz o menor sentido, seja qual for o ângulo a partir do qual o caso seja examinado. Ou, como tem que ser lembrado, em comparação com delitos muitíssimos mais graves, envolvendo casos de corrupção de que tanto de fala, que produziram efeitos até singelos, como a prisão domiciliar e o uso de tornozeleiras.

Privilégios reservados a alguns poucos, peixes graúdos, alegadamente por conta dos riscos representados pelo coronavírus. Igualmente elementar é a constatação de que o próprio conceito de privação da liberdade se perdeu, produzindo como único resultado concreto o aumento da população carcerária, hoje a terceira maior do planeta.

Mudar significará sim, em muitos e muitos casos, fazer justiça, mas antes de tudo será o mesmo que desarmar a bomba antes de uma fatal explosão.

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