Diante de uma crise fiscal sem precedentes e com déficit estimado para mais de R$ 20 bilhões neste exercício, o governo de Minas Gerais alega que não tem recursos para garantir os repasses de duodécimos ao Legislativo e Judiciário nem para cumprir com os vencimentos do funcionalismo do Executivo. Ao detalhar a situação financeira do Estado, o governador Romeu Zema (Novo) pediu ajuda aos outros Poderes para contornar a situação.
“Não temos condições de continuar pagando as obrigações do Estado, mesmo as mais relevantes. Não haverá recurso para pagar a folha do Executivo nem o repasse aos Poderes. A lei me manda fazer as duas coisas. Se ela resolvesse nosso problema de caixa eu ficaria satisfeito. Mas, nem todo contingenciamento que fizemos em programas sociais foi suficiente. O povo mineiro já está pagando a conta há muito tempo e já estou em contato com os líderes dos demais Poderes para tentarmos resolver em conjunto”, anunciou em entrevista coletiva.
Segundo Zema, uma reunião já está marcada para a próxima quinta (21) com Legislativo e Judiciário, visando dialogar sobre os pagamentos. O governador lamentou a situação financeira do Estado dizendo que a atuação situação foge ao alcance do Executivo e que somente será resolvida no médio e longo prazos, com reformas estruturais.
“Posso ocupar o cargo que for, mas sou cidadão como todos os outros e devo olhar pelo bem comum e maior da população e não meu ou do meu grupo. Muita coisa no setor público está privatizada, atendendo a interesses de alguns grupos. E isso tem que mudar”, avaliou.
Para Zema, não há servidores mais ou menos importantes. “Ninguém é superior a ninguém. Não podemos ter funcionários de primeira, segunda e terceira categoria”, completou sinalizando que, assim como os servidores do Executivo, também o Legislativo e o Judiciário devem ser impactados pela queda de arrecadação enfrentada pelo Estado.
Polêmica – A fala veio em resposta ao Projeto de Lei 1.938/2020, aprovado na quinta-feira (14) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O projeto prevê que o governador responda por crime de responsabilidade caso não repasse integralmente e dentro dos prazos os duodécimos destinados aos Poderes Legislativo e Judiciário.
Logo após a aprovação unânime, a ALMG emitiu nota esclarecendo que o projeto de lei somente reafirma o que está previsto no artigo 168 da Constituição Federal de 1988, que prevê o repasse dos duodécimos. E que o não repasse dos recursos é inconstitucional e demonstração clara de tentativa de se sobrepor ao trabalho dos demais poderes.
Na sexta-feira (15), os deputados Sargento Rodrigues, Hely Grilo, Delegada Sheila, João Vitor Xavier, Coronel Sandro, Oswaldo Lopes, Cleitinho Azevedo, João leite e Bruno Hengler pediram a anulação de votação de artigos do PL 1938/2020, que tratam do repasse de duodécimo.
Em nota enviada à imprensa, os parlamentares alegaram que foram induzidos ao erro. Segundo eles, durante a apresentação do parecer, o relator, deputado Gustavo Valadares, não fez a leitura completa do substitutivo. Disseram ainda que se não for possível anular a votação por este meio, vão aguardar o veto do governador para fazerem as intervenções possíveis e necessárias. Eles não descartam acionar o Poder Judiciário caso seja preciso.
“O texto que havia sido encaminhado aos deputados, e distribuído para todas as assessorias, com a devida antecedência para que pudesse ser analisado, não continha os artigos 3º e 4º. Esta determinação faz parte do acordo de líderes estabelecido para que a votação remota fosse possível, prevendo que todos os pareceres, a serem votados na semana, sejam encaminhados até às 14 horas de terça-feira”, disseram no documento.
Ainda conforme os parlamentares, o deputado Gustavo Valadares, relator do projeto, não leu, em Plenário, a parte referente aos artigos, que são exatamente os que tratam do repasse de duodécimos aos Poderes e Órgãos.
“Aprovamos um texto ao qual não tivemos acesso e conhecimento, na íntegra. Ao colocar em votação um substitutivo que não foi lido, houve clara violação do acordo de líderes e descumprimento do que determina o Regimento Interno, não nos permitindo, inclusive, apresentar emendas supressivas ou destacar os artigos para votar de forma contrária”.
Procurado, o relator, deputado Gustavo Valadares, limitou-se dizer, por meio de nota, que “Parlamento é uma casa democrática. Posso não concordar com o que alguns pares dizem, mas respeito o direto deles de se manifestarem”.
Resultado deve ficar negativo em R$ 20 bi
Além do governador Romeu Zema, participaram da coletiva, na sexta-feira (15), o secretário-geral, Mateus Simões; o secretário de Governo, Igor Eto; o secretário de Fazenda, Gustavo Barbosa; e o secretário de Planejamento e Gestão, Otto Levy.
Em sua apresentação, o secretário de Estado de Fazenda, Gustavo Barbosa, voltou a dizer que déficit fiscal de Minas Gerais pode chegar a R$ 20 bilhões neste exercício. O problema de caixa no governo mineiro já se arrasta por anos e a crise econômica imposta pelo novo coronavírus (Covid-19) está agravando ainda mais a situação. A previsão é de uma queda de R$ 7,5 bilhões na arrecadação do Estado em virtude da pandemia.
Antes dos impactos da doença na economia, o Executivo já previa um déficit de R$ 13,3 bilhões na Lei Orçamentária Anual (LOA). Segundo Barbosa, só a arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) teve uma queda de 20% em abril.
“A situação, que era grave, se agravou durante o coronavírus, uma vez que o Estado depende do ICMS para honrar seus compromissos, pois não emite moeda, não tem capacidade de crédito e nem poupança para fazer frente às despesas. O Estado vem, desde 2013, sistematicamente trabalhando com orçamento negativo, o que mostra que temos um problema estrutural, gastando mais do que arrecada”, alertou. (MB)
ALMG e TJMG falam em parceria
Em nota conjunta, a Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais afirmam que estão cientes das enormes dificuldades que o governo estadual vem enfrentando desde que assumiu e têm sido parceiros constantes, na busca de soluções.
De acordo com a nota, o Poder Judiciário, por exemplo, foi o condutor do acordo que viabilizou o pagamento parcelado das dívidas com os municípios e desde o início da pandemia vem agindo solidariamente, possibilitando o aporte de recursos para ações de combate ao coronavírus.
“A Assembleia Legislativa, por seu lado, aprovou até este momento, após amplos e indispensáveis debates, todas as proposições enviadas pelo Executivo relacionadas com a crise do Estado e o combate à pandemia” afirma.
Segundo a nota, tudo isto tem sido obtido graças a um entendimento constante entre os chefes de Poder e suas equipes, o que acreditamos que continuará ocorrendo, para que encontremos soluções adequadas.
“O governador Romeu Zema tem agido com respeito aos Poderes Legislativo e Judiciário e nós confiamos que, mantido esse clima de respeito, encontraremos em conjunto uma boa solução, como tem sido até agora”, conclui. (Da Redação)