Startup cede à realidade e se une à imobiliária tradicional

17 de abril de 2019 às 0h01

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KÊNIO DE SOUZA PEREIRA*

A imobiliária virtual que se diz inovadora por não ter nem sede física para atender os clientes, pois para ela em uma locação nunca ocorre problema, parece que caiu na real. Sem ter profissionais contratados para atender, percebeu ser difícil manter o locador como cliente.

O modelo não funcionou em Belo Horizonte, visto que os proprietários de imóveis não aceitam ser atendidos por robôs que respondem suas reclamações com frases pré-programadas, como se constata no site Reclame Aqui.

A 5º Andar, ao se unir à imobiliária, que antes dizia ser ultrapassada, alegou: “a startup compartilhará de toda a tradição que a Casa Mineira já tem no mercado mineiro”.

Será que a inovação deu marcha à ré? Será que a ideia que apresentava como revolucionária não convenceu os proprietários de imóveis que perceberam que a 5º Andar presta serviços na realidade é para os pretendentes a inquilinos, pois realiza locações sem qualquer garantia, deixando o locador no risco de ficar sem receber os aluguéis e encargos (IPTU, taxa de condomínio, água, luz) por vários meses no caso de inadimplência?

Todos sabem que a locação é um negócio de risco e que a maioria dos problemas ocorre justamente no momento que o inquilino desocupa o imóvel e se recusa a quitar os débitos finais e os reparos do imóvel, os quais muitas vezes atingem valores elevados para que ele esteja apto a ser locado novamente.

Se a 5º Andar tivesse sido um sucesso em Belo Horizonte, conforme divulga com seu tremendo marketing, não se recusaria a divulgar os números reais de quantos imóveis intermedeia. Certamente não estaria agora divulgando que está aberta para se unir e fazer parceria com as imobiliárias tradicionais, as quais antes criticava. Pelo visto, deu um passo atrás na inovação.

A proposta da 5º Andar de divulgar no seu site o pagamento de R$10,00 para “os mostradores de imóveis” levarem os candidatos aos imóveis disponíveis para locação realmente não tem nada de inovadora. Um corretor qualificado não aceita receber tal remuneração.

Será que os locadores sabem disso? Algum profissional aceitaria receber isso para intermediar os conflitos que ocorrem entre o inquilino e o locador, em especial, no momento de uma inadimplência ou devolução do imóvel? Por ser óbvia a resposta, a startup cedeu à realidade ao constatar que os locadores são sábios, pois viram que os problemas se agravariam no momento que ocorresse a desocupação, não tendo como resolver os conflitos por e-mails.

Para o locador entender o risco que corre, basta exigir a apólice da Cia Seguradora, relativa ao Seguro Fiança em nome dele e com o endereço do imóvel. Constatará que ela não existe. Bem moderno, mas nem tanto!

As imobiliárias tradicionais, especialmente as que fazem parte de redes, como a Netimóveis, que tem 22 anos, ao interligar pela internet quase 70 imobiliárias em Belo Horizonte, unificando procedimentos inovadores, alugam centenas de imóveis com o foco na proteção ao locador, pois para elas o principal cliente é o proprietário do imóvel que merece ter garantias concretas e não apenas ilusão.

Alertamos os proprietários sobre essas novidades nos artigos publicados no Diário do Comércio: “Alugar sem garantia é irracional”, em 30/01/19; “Imobiliária: para quem presta serviço?”, em 1º/11/18 e “Propaganda Enganosa”, em 02/07/18.

Dezenas são os casos de locações que acontecem no mesmo dia em que o imóvel é colocado à disposição, pois muitas vezes um vizinho, um amigo de quem está desocupando ou um pretendente cadastrado na imobiliária já aponta interesse em locar determinado imóvel. Isso é rotineiro há séculos, nesse ramo ou em outros, como a venda de um carro que alguns amigos avisam que desejam comprar caso ele seja colocado à venda.

Nem por isso a Netimóveis divulga tal fato corriqueiro como se fosse uma coisa do outro mundo, sendo que a startup diz que “foi na cidade que registramos o recorde de aluguel, em uma hora e meia, considerando o momento que o imóvel fez o cadastro até a hora em que o inquilino assinou o contrato”.

Qual recorde mesmo? Nas centenas de imobiliárias tradicionais, em especial, as 70 administradoras que fazem parte da Netimóveis, o locador não paga nada para anunciar, sendo que possui também aplicativos que facilitam a locação, como o Loc Fácil e Pro Imob. Entretanto, as startups parecem desconhecer isso e agem como se tivessem inventado a roda ao divulgar novidades (não cobrar anúncio e pagar em dia) já antigas.

Vemos que as startups têm realmente de inovador é o marketing, o foco em prestar serviços em primeiro lugar para o inquilino e deixar o locador com alto risco de ter prejuízos, especialmente no momento da desocupação do imóvel.

A magia e a sedução da propaganda de que vende inovação, sem segurança, ignora que somente em Belo Horizonte, na 31ª Vara de Locações do Fórum há 10 mil processos, os quais demoram anos para serem concluídos. Há apenas um juiz, que apesar de ser muito competente, não tem como fazer milagres e agilizar a solução daqueles que não pagam os aluguéis e danos dos imóveis em pouco tempo.

Por outro lado, se o proprietário do imóvel acredita que todas as pessoas são honestas e cumpridoras dos contratos, a ponto de ser dispensável o Poder Judiciário, e que não terá nenhum problema, poderia então alugar direto e economizar a comissão da startup, que basicamente faz dois contratos com centenas de cláusulas e parágrafos, além de emitir o boleto de pagamento do aluguel.

Pelo visto, a 5ª Andar, por meio de parceiras que a Netimóveis já faz há 22 anos, está criando agora locais para atender aos clientes, já que viram que o tradicional é o que funciona.

*Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG; conselheiro da Câmara do Mercado Imobiliário de MG e do Secovi-MG. kenio@keniopereiraadvogados.com.br

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