Mauro Werkema*
Relembrar o significado dos 300 anos da criação da Capitania das Minas, a 2 de dezembro de 1720, não representa somente a exaltação cívica de uma data histórica.
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É oportunidade, de evidente valor simbólico, para uma reflexão sobre a tricentenária trajetória histórica de Minas Gerais, seus feitos e lutas por domínio territorial, sua afirmação como povo e sociedade, organização social e urbana, conformação de uma distinta identidade regional e os traços da personalidade mineira.
Mas, e sobretudo, as lutas por emancipação política e econômica, ciclos e crises e sua ressignificação na contemporaneidade. Mas, e indispensavelmente, estimular a discussão necessária, senão inadiável, sobre a crise mineira dos nossos dias.
Convivem em Minas tradição e modernidade em uma exemplar diversidade cultural e natural gerada pela singularidade de sua formação, desde os anos de passagem entre os séculos XVII e XVIII pela ocupação pioneira do território interior do Brasil-Colônia em busca do ouro.
Da “Minas minerária”, na expressão de Guimarães Rosa, e seus ciclos de exploração, do ouro ao ferro, Minas deve sua origem, seu nome e sua formação. Mas também, na visão crítica da historiografia contemporânea, a sua espoliação econômica, que deveria ter colocado o Estado em melhor estágio de desenvolvimento.
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Na Colônia, no Império e na República, os mineiros atuaram decisivamente na formação da nacionalidade brasileira. Gerou surto cultural e artístico de renome internacional no Ciclo do Ouro. Com os inconfidentes de 1789 é pioneira no sentimento nativista.
Contribuiu para a Independência de 1822 e para a formação das leis instituidoras do Império, com Bernardo Pereira de Vasconcelos, e para o ajuste com a Revolução Liberal de 1842, de Teófilo Otoni. Inspirou o movimento republicano que buscaram em Tiradentes e os poetas inconfidentes inspiração e modelo.
Em Ouro Preto e cidades históricas os modernistas descobriram uma autêntica cultura brasileira, com Aleijadinho e Athayde, e nela fundamentaram a política de defesa patrimonialista, com o IPHAN, em 1937, com Gustavo Capanema, Drummond e Rodrigo Melo Franco de Andrade. Deste “caldo de cultura” surge a mineiridade, “mistura de mineirismo cultural e mineirice política”, no dizer de Afonso Arinos.
É preciso rever os 300 anos à luz da crise atual. Ver o que o passado nos ensina e aponta quanto aos valores que ensejam a emancipação econômica. Minas é rica, de solo e subsolo, de recursos humanos, de lições e experiências históricas e de vida, de homens públicos.
E convocar para um novo tempo através de debates que envolvam a todos, na disseminação de conhecimento e consciência da nossa formação. E que o “espírito de Minas”, que a história nos mostra e Drummond nos lembra, ilumine esta reflexão e permita uma atuação firme, uma vez mais, no enfrentamento da realidade adversa.
E lembrar também o quanto, em diversos momentos, tem sido valiosa a contribuição de Minas ao Brasil, a merecer retribuição. Finalmente, aplica-se bem no momento a conclamação conspiratória de Tiradentes aos mineiros: “Se todos quisessem poderíamos fazer do Brasil uma grande nação”.
*Jornalista – mwerkema@uol.com.br